quarta-feira, abril 21, 2004

A LUA

Após encontrar Marte e dele receber a primeira das sete lições, me foi ensinado que a vida é luta, conflito e conquista. "É preciso tornar-se grande e conquistar espaço", ele me disse.

Mas eu não estava satisfeito, alguma coisa estava faltando, e eu precisava descobrir o que a vida era, se havia algum sentido. Eu sabia que uma porta havia sido aberta e que os espíritos estavam tomando corpos na Terra, e a possibilidade de falar com cada um deles me fascinava - e assustava, admito.

Não foi preciso procurar muito para encontrar a Lua. Ouvi falar de uma mulher que era a porta para todas as marés do mundo, e cujo rosto não tinha consistência sólida, assemelhando-se mais a um espelho líquido que horas era sombrio como uma velha pedra negra,
em alguns momentos refletia pequenos raios de luz, mas jamais a luz inteira. Ela era jovem, mas se eu olhasse com o canto dos olhos poderia ver que se tratava de uma velha. Tudo era noite ao seu redor, e eu me senti tranquilo e confortável. Estava um pouco cansado do calor avermelhado e tórrido do meu encontro com Marte.

A Lua abriu suas asas sobre mim, me oferecendo conforto, como que adivinhando meu cansaço. Eu olhava para seu rosto, mas não conseguia ver nada definido, e tive um pouco de medo. Me parecia um espelho, mas ao mesmo tempo não era. Vi a mim mesmo como eu fui e como
poderia ter sido em diversas circunstâncias. Ocasiões e fatos passados foram transbordando, coisas que eu sequer recordava, numa intensa e assustadora onda que varria meus pensamentos concretos. Como seria possível não se encantar por aquela mulher? O Sol era sem dúvida adorado, mas ninguém conseguia chegar perto dele, de tão quente e brilhante que era. E as pessoas não queriam claridade total, preferiam os semitons da luz refletida.

Quando a encontrei, ela estava cheia: cheia de luz, de sangue e marés. E eu lhe perguntei o que ela tinha a me oferecer.

- "Eu ofereço conforto e sonho" - disse ela - "para que todo seu cansaço se torne passado e todas as dores apenas memória".

- Eu gostaria apenas de saber o que a vida é - disse, por minha vez.

Com um gesto de sua mão esquerda, toda a realidade em torno se desfez, tornando-se um caleidoscópio em que o que aparentava ser uma pedra se revelava uma planta, que repentinamente explodia na forma de um bicho qualquer, e então eu percebia que estava olhando para minha própria imagem refletida. Fiquei muito tonto. Não sabia mais o que era real ou mera ilusão. Meus pensamentos eram transparentes neste contexto, e a Lua disse:

- "Não existe real e ilusão, existe apenas o sonho e sua capacidade de sonhar. A única coisa real são as memórias que você tem das coisas. Nada além da sua lembrança das coisas, que é o que torna tudo verdade."

- Mas aprendi com Marte que devo me esforçar para conquistar meus desejos...

- "Ele mente para ser alimentado. Um desejo dá lugar a outro desejo, e assim sua busca nunca termina. Eu ofereço o acalento do sono: vem e dorme. O que mais você poderia desejar?"

Olhei ao redor e pude ver uma montanha humana que dormia, e um sorriso marcava seus rostos.

- "Veja como estão todos felizes" - disse-me a Lua Cheia - "Não há o que conquistar, há o que recordar. Todas as coisas já foram conquistadas, tudo já foi criado, não há nada de novo no mundo. Tudo que existe de real é apenas memória."

- Mas por que você me oferece esta luz pálida? Não consigo ver as coisas claramente com a sua luz. Dê-me a luz do Sol!

- "E quem precisa do Sol, do Sol causticante, que ofende os seres com os detalhes minuciosos de suas rugas e com a revelação explícita de suas falhas e imperfeições? Sob minha luz, que é um pouco do que roubei dele, todas as coisas são belas. Vem, tenho um lugar só pra você."

Assim falando, sua luz esmaeceu e ela tornou-se Minguante. Se nada antes era tão claro, tornou-se então impossível ver algo com nitidez. À minha frente, vi o que parecia ser meu quarto de criança. Me pareceu agradável a perspectiva de não precisar me preocupar mais
com nada. Então lembrei-me de Marte, do desagradável Marte, que me ensinou a subir montanhas escarpadas e a nadar em lagos escuros. Eu não queria dormir e sonhar, eu queria a verdade, e não era em minha infância que eu a iria encontrar.

Disse não.

E a Lua, tornando-se Nova e escura, nada mais me disse".

Alexey Dodsworth

domingo, abril 18, 2004

TIGRE

Compara-se ao tigre, me informa de leões distantes, tubarões e estabelece
geograficamente onde mora.
Diz da riqueza e da pobreza, da beleza e da feiúra, da mediocridade e da
filosofia. A dualidade, a antítese.
Não cansa de ser narciso, sem precisar de espelho, se compara aos Baldwin.
Ele, não. As outras pessoas.
Deseja ser como Tolkien e outros que desconheço o nome porque ainda não
contou.
Quer imortalizar a escrita, morrer e deixar viva a obra, como os grandes
gênios, os mestres.
Alerta para ter cuidado, para eu não esperar nada.
Diz que sou diferente, mas não inexplorada. Acha-me cópia de algo que
viveu.
Eu rio disso tudo, não sei onde vamos parar. Quero me lançar nesse universo
sem peso, sem estabilidade e que não exibe saída.
Perambulo por esse trajeto com uma lamparina antiga, mas os meus pés ainda
estão sem apoio, não enxergo-os. Sigo o fio da meada, sem medo de encontrar
um monstro que tenta me pegar e destruir o que parece existir de grande, bonito
e forte.
Vamos ver. E esse jogo de palavras, dá sabor, refresca, dá vontade de
continuar seguindo em sua direção, desafiando sua arredoma invisível,
penetrando seu ego inflado e sua pseudo-segurança.
Não há nada que me empeça de chegar ate aí, até você. A menos que interrompa
esse elo formidável e distante.
Retiro disfarces, você larga mais máscaras pelo caminho.
E se me dá prazer, por que parar?!
Venha, como a esfinge, devore-me!

domingo, abril 11, 2004

MÁSCARAS POR ALEXEY

"Num dia esquecido, muito tempo atrás, mais tempo do que seria confortável recordar ou saudável admitir, dez rostos desabaram do Céu, cada rosto contendo a essência de um espírito, cada máscara sendo a porta para uma dimensão da realidade.

Os deuses, ansiosos pela vida na carne, esperavam por quem vestisse suas faces, liberando-os do jugo entediante da abstrata vida espiritual.

Nenhum homem ou mulher mortal, todavia, ousava vestir a máscara. Temiam tornar-se os deuses que tanto veneravam. Preferiam a segurança de terem a quem adorar. Alguns homens sábios espalharam as dez máscaras por cantos ocultos do planeta, rogando para que ninguém as vestisse. Tinham medo da própria grandeza.

"Queremos carne", gritavam os espíritos furiosos, "desejamos sorver da vida até a sua última gota". Mas tinham que se contentar com as pequenas oferendas que os mortais lhes faziam. Incenso, em alguns momentos. Mantras, em outros. Às vezes até mesmo sangue e assassinato, ou mesmo sêmen e orgasmos. De morte e vida se alimentavam os espíritos atormentados. Livros eram escritos sobre eles e nomes eram criados para definí-los. Mas nada parecia fazê-los descansar.

Durante muito tempo estes rostos permaneceram esquecidos. E os deuses, invejosos da carne humana, se contentavam em dividir pequenos pedaços dos incontáveis corpos mortais de que dispunham. Dançavam dentro dos homens, às vezes brigavam entre si, entravam então em acordo. Se amavam para logo então tentarem se aniquilar. E durante um longo, longo tempo, houve inocência na Terra, homens e mulheres em suas vidas comuns e deuses se satisfazendo com os pequenos momentos em que podiam se sentir vivos através dos corpos mortais. Mas nenhum deus, absolutamente nenhum espírito, tinha a permissão de tomar inteiramente um corpo só para si.

Até que um dia um lamento despertou o Sol. E por um pequeno átimo de segundo, tudo o que é Sol no Universo concentrou-se naquele pequeno rosto perdido, naquela face dourada.

Era chegada a hora de despertar, e o Sol entoou seu cântico e abriu seus olhos. Quem o atenderia?

E a voz disse [com fogo jorrando para dentro e para fora]:

- Vista-me!".

Alexey Dodsworth

Astrológo, amigo, um querido.

segunda-feira, abril 05, 2004

Depois de dias de confinamento, longe das ondas cibernéticas
E eis que volto à tona, emergindo de um torpor providencial.
A vida e suas instâncias necessárias e professoras, as que nos acenam e
Dizem da importância das mudanças, perspectivas e caminhos.
Abro o Word, abro a conexão, minha janela está aberta a você,
Aos que aqui vem e se debruçam na sacada, a espreitar letras,
Sentimentos e paixões.
Volto: abro mais dias em Abril.