terça-feira, junho 07, 2005

INTERLÚNIO

Há céus que se cobrem de negro e absolutamente nada corta essa ausência de luz.
Dizem que essa chapa celeste jamais acontece no deserto, aonde as constelações são mais cintilantes que qualquer outra parte do planeta. Em parceria, as areias são escaldantes durante o dia e gélidas quando a noite acorda, assim como se levanta o vento abrasador da manhã e o ar torna-se congelante de madrugada. E é nessa hora, quando a visão não alcança além de dois palmos adiante dos pés, que criaturas horripilantes saem da toca para caçar, saciar-se.

E ao contrário do deserto, no interlúnio a negritude parece cobrir toda a terra, quando estamos em perspectivas aquém das tempestades, principalmente as de areia. E nos atrelamos às construções duras e frias de pedra. A civilidade parece arrogante e distante do que é natural, energeticamente virgem. O mundo de concreto é tal qual móbile infantil, clone do projeto arquitetônico ao lado.

Polarizando o movimento, não há fixidez nas caravanas que disputam um pedaço oasiano. E miragens confundem os viajantes sedentos e exaustos por dias consecutivos na corcunda de camelos. Tendas são armadas, construindo um pouco de sombra diante do astro-rei que não dá trégua. Tapetes espalhados sob os grãos ferventes, minimizando o que parece queimar qualquer um que ouse tocar esse mar calcário.

A Lua no minguante surge na grande tela, nas mil e uma noites de Sherazade. Aquela que enganou a morte com palavras, persuadindo e seduzindo seu maior inimigo. Plantou nele a semente insaciável da curiosidade.Ela segue adiante, sob o véu, deixando à mostra os olhos, pequenos, amendoados, rasgados como a cadente que só se vê em luares espetaculares, um pequeno traço a riscar as esquinas do espaço sideral. Delineador branco manchando a escuridão.