sexta-feira, novembro 28, 2003

CIGANO

Tudo que ele toca é ouro.
Do violão ao sax, o som, a melodia, os acordes.
Das partituras e rimas produz frisson, empatia.
Do jeito natureba e budista, encantamento.
Não olha, não encara, não dá chance.
Nem bilhetes e nem ligações surtiram efeito.
Se o que foi feito fosse ruim até daria para entender.
E não foi. Ou será que foi e não me dei conta afinal?
Só sei que barbudo, com costeletas, ainda assim fica com cara de cigano.
O pequeno brinco na orelha compõe. Se pusesse um lenço vermelho ficaria perfeito.
Gostaria de não olhar e não sentir.
Gostaria que tudo voltasse ao que era antes.
Quem sabe um dia ele me dá a chance de falar?
Quem sabe um dia...



terça-feira, novembro 25, 2003

A CHUVA LÁ FORA...

Depois de uma torrente calorenta e ensolarada, ela chega.
Mansa, sem ruídos, apenas num ensaio encharcando a terra.
Trovão nem pensar, relâmpagos ao longe, nem barulho faz.
Aclara a comunicação interrompida por dois dias consecutivos.
Fibra ótica dando lugar a velha fiação.
A tele que domina é mar.
E eu aqui à mercê da chuva, da que cai e refresca.
Dos homens lutando contra o tempo, embaixo do guarda-chuva.
Fazem promessa e garantem que de hoje não passa.
E não é que deram um jeito?
A água continua descendo do céu e a linha consertou.
Aqui estou.


sábado, novembro 22, 2003

ESQUINA

Quantos adeuses ainda existirão pela frente?
Quantas saudades ainda somarão dentro do peito?
Quantos deuses divisarão os mundos,
tal a pluralidade de estágios e planetas?
O dia cinza, eu também.
Neutralidade e nostalgia se fundem.
Tantas promessas faço para em seguida pô-las a nocaute.
Se pudesse controlar a vida seria muito bom.
Mas por mais que eu lute contra o senhor imponderável, ele
sempre consegue driblar minhas estratégias e derrubar minhas mais potentes milícias.
No espiral da existência, a escada em caracol perfaz um antigo caminho.
Eu sigo por essa calçada nua e caminho por entre as folhas secas e amareladas que lotam o chão.
O vento é meu único companheiro, além das nuvens escuras que telham o céu.
Adiante atravesso um cruzamento, vejo os luminosos e apelos comerciais.
Na próxima esquina não sei que virá.

quarta-feira, novembro 19, 2003

DILATAÇÃO

A eclíptica reproduz o movimento.
As mil mãos se dirigindo de um ponto a outro.
Num portal, uma vez em lua cheia, aconteceu.
Levou testemunhas, dividiu a descoberta.
Perceberam a vibração.
Um aceno a outra dimensão, um cumprimento amigo.
Druidas enfileirados manchavam de branco a floresta escura.
Hoje, a energia se esparge produzindo uma visão além,
nessa tela clara e cinzenta do programa.
Adiante do que os olhos físicos vêem.
Visão terceira que se alarga e se expande,
alastrando a percepção e os dons.

domingo, novembro 16, 2003

GRAVIDEZ

Às vezes retorno a comentários que foram ditos e não assimilados.
Não sei se todo mundo é assim.
A pessoa diz, você escuta, mas lá no íntimo a coisa parece precisar de um empurrão.
Fica flutuando em algum canto da memória e não se desfaz.
Hoje, vendo uma fotografia, a ficha parece que realmente caiu.
Alguém termina o relacionamento com outro alguém.
Um deles vai sofrer na maioria das vezes, se há amor ainda.
O outro, imediatamente, recorre a um novo parceiro.
Dizem que esse estado é de gravidez.
“Normalmente os homens ao terminar um longo relacionamento ficam instantaneamente grávidos.
Tão barrigudos diante da solidão que querem logo casar”.
Foi isso que um amigo me falou ao término do namoro. Na hora compreendi, mas não absorvi.
Ele vai se casar e eu espero que seja feliz.


quarta-feira, novembro 12, 2003

VÔO

Os sons tantas vezes nos arremessam a outra linha.
Aquela que faz parte do horizonte e parece infinita.
A mesma que vejo da beira da praia, quando paro para ver o sol se pôr.
A música me dá asas, tal Ícaro, mas diferente dele, não derretem a cera.
Na amplidão do ar salgado, o que impregna e transporta,
nesse vôo de asas abertas, braços também, e alma liberta, vejo
um sol despencando no horizonte, ainda que os raios aqueçam a fronte
e o vento acaricie com sua delicadeza.
Nesse tênue espaço entre o que miro e o que sacode a alma por dentro,
passo a compor o mosaico, o quadro, da tela mental que vive em meu íntimo, no âmago do ser.
E nesse encontro, me vejo como sou.

sábado, novembro 08, 2003

NOVEMBRO

A semana voou tal como folhas que se desprendem das árvores e
colorem o chão com seus tons.
Hoje, talvez possa equilibrar os hemisférios, a luz e a sombra.
Atingiremos o eclipse total, onde a Lua que estará na cheia será coberta com um manto negro.
Por instantes somente as estrelas divisarão pontos claros no espaço.
O celeste se perpetuará negro pela madrugada.
Quem sabe a aura de Escorpião tenha tatuado seu astral.
Das cinzas que se esvaem para um novo nascer luminoso.
Novembro chega e traz seus fabulosos eventos.
Abro mais trinta trinta dias e a vida continua...



terça-feira, novembro 04, 2003

DOS DESERTOS

Ela sempre aproveita as letras que escorrem por essa página, nem sempre tão inspiradas e muitas vezes insipientes, desprovidas de sentido, caminhante como eu, errante e às vezes marginal. Atualizou o Letra de Corpo com um dos meus muitos desertos, dos tantos que já estiveram figurando por aqui...
Letra D, de destino, derradeiro, descaso, deboche,desritmo, despropósito, depósito, damasco, dedão, dízimo, deidade, dali, de cá e de lá.