quarta-feira, julho 16, 2003

O corpete disposto sobre o corpo, gentilmente revela o torço longilíneo.
Deixa aparente a pele morena, a mesma que conjumina com os cabelos mate.
Lisos, caem pelos ombros.
A cintura marcada por uma saia comprida, bicolor.
Por cima escuridão, embaixo carmim.
As ancas em inclinação acompanhando a circunferência do tecido.
Ela olha por detrás do ombro, de soslaio para ele.
Gosta da situação e se prepara para a apresentação.
Pega as castanholas e começa um leve som, sincopado.
A tatuagem de henna marca os pés, numa alusão a mendhi indiana.
O guizo produzido pelo movimento do tornozelo hipnotiza o olhar dele.
Movimenta os braços, mostra a sua desenvoltura e força.
Dessa vez, encara-o, sem titubear.
As velas acesas iluminam o cômodo, um enorme círculo a protegê-los.
Nada de ruim pode acontecer, o rito da estrela de cinco pontas os protege.
Ele percebe a doçura do ser, a fragilidade, ainda que ela dance com toda a sua energia.
Austera, segura, flutua, marca o passo, desafia. A boca se abre, ligeiramente.
Os movimentos seguem o ritmo frenético da música, a mesma que o convida também a mexer o corpo e entregar-se ao som que se propaga por todo o cômodo. Prefere permanecer como espectador, guardando para si os desenhos que ela vai riscando no ar, sem pudor.
Ao fim da música, ela dispôs do átame, desfez o círculo, assoprou as chamas coloridas e perfumadas que assolavam o ambiente. E se viram, dessa vez frente a frente, naquele galpão vazio, onde só o clarão do luar ousava entrar pela janela.